sexta-feira, 12 de junho de 2015

Adesão ao tratamento na psicoterapia psicanalítica de crianças

Estudos recentes demonstram que 30% da população mundial apresenta alguma forma de transtorno mental e que cerca de 10 a 20% das crianças brasileiras sofrem de doenças psiquiátricas. Existe uma preocupação crescente dos profissionais da área da saúde com  a defasagem evidente percebida entre a referida necessidade e a busca por tratamento especializado. É grande o número de crianças que, depois de procurar ajuda, abandona ou não chega a iniciar o tratamento.

É alta a prevalência de desistências durante o período inicial do tratamento, e a maior parte da literatura sobre o tema se dedica à população adulta. Uma investigação metanalítica sobre interrupção da psicoterapia revisou estudos e encontrou que somente poucos envolviam amostras compostas por crianças. Desde essa revisão, o número de estudos realizados em centros comunitários de saúde mental com crianças continua escasso.
No entanto, entender o perfil da clientela que não adere à psicoterapia psicanalítica seria um primeiro passo na elaboração de medidas para tentar engajar essas crianças e seus responsáveis em psicoterapia; também auxiliaria na revisão de critérios de indicação e contraindicação para essa modalidade terapêutica, a fim de atualizar as ferramentas técnicas para a demanda atual de crianças em psicoterapia.

Investigações constataram que a fonte de encaminhamento constitui-se como fator preditivo de aderência e não aderência à psicoterapia psicanalítica de crianças. Crianças que são encaminhadas pela família correm mais risco de não aderir à psicoterapia, e as encaminhadas por psiquiatras têm mais facilidade de vinculação ao tratamento durante a fase inicial do processo psicoterápico.

No que concerne ao encaminhamento para psicoterapia, constata-se que, sendo os sintomas externalizantes o principal motivo de consulta em crianças, muitos pacientes infantis acabam sendo encaminhados à psicoterapia porque perturbam o meio em que estão inseridos (a escola, o convívio com amigos, as práticas desportivas, etc.). Na amostra deste estudo, a escola constituiu-se como maior fonte de encaminhamento para psicoterapia, percebendo, antes dos pais, a necessidade de atendimento para as crianças.

A associação entre fonte de encaminhamento e aderência à psicoterapia psicanalítica de crianças demonstra que a trajetória realizada anteriormente pelos pais em busca de atendimento para seus filhos é um fenômeno complexo e importante para a fase inicial do tratamento psicoterápico. Diferenças encontradas entre abandono e não aderência nos preditores de fonte de encaminhamento salientam que pesquisas devem ser estimuladas sobre a conduta dos pais na procura de auxílio psicológico para seus filhos, a fim de reduzir barreiras ao acesso a atendimento da saúde mental de crianças.

As variáveis associadas ao abandono do tratamento de psicoterapia são diferentes das variáveis associadas à não aderência, o que justifica a necessidade de  diferenciação desses dois fenômenos por parte de pesquisadores e clínicos em suas práticas profissionais. Na medida em que poucos estudos usam uma diferenciação conceitual entre abandono e não aderência, os resultados das pesquisas destinadas a avaliar o desfecho da psicoterapia acabam se confundindo, dificultando a generalização dos achados. Muitos dos resultados encontrados são de difícil interpretação e sua discussão não pode ser esgotada e sim estimulada para que mais e pesquisadores sigam debruçando-se sobre esse tema, a fim de melhor elucidar o fenômeno.

FONTE: – GASTAUD et al. Não aderência à psicoterapia psicanalítica de crianças. Rev Psiquiatr Rio Gd Sul. 2011;33(2)

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